Conheça um pouco da trajetória do artista João Dias, carinhosamente conhecido por Dão, uma âncora da arte e cultura na Enseada de Brito
É necessário pouco tempo para se sentir em casa e ser absorvido pelo acolhimento da Enseada das Artes, da natureza que cerca o local e das iconografias que tomam conta do lugar.
Talvez seja o cheiro do café ou o aroma do pão de panela temperado com majericão que toma conta do ar e nos traz uma afetividade que nem conhecíamos ou que não lembrávamos mais. Fato é que as grandes panelas fervendo no fogão a lenha somado ao olhar que percorre cada detalhe do entorno decorado naturalmente e paulatinamente por mais de 3 décadas, nos transportam para uma curiosidade e felicidade genuína que, por vezes, ficou lá na infância.
Entre conversas, comida na mesa, café na xícara e as peças variadas de cerâmicas, a gente ainda descobre e redescobre a arte. Seja no atelier do artista, em objetos dispostos ao ar livre, na configuração das construções, nas açorianidades presentes em todo canto, existe uma inquietação artística que ronda o lugar e que é a alma do Dão.
O encontro com essa parte significativa da sua história e a criação desse pedaço de chão tão cativante que sempre esteve ali mas que foi, também, esculpido por suas mãos, foi inusitado. Quando chegou à área de mais de 6 mil metros quadrados Dão não acreditou que, já tendo percorrido toda a Enseada de Brito, existia um lugar assim. Foi amor à primeira vista: natureza exuberante, um afluente que vem diretamente da Cachoeira da Enseada e desemboca no mar, um mangue totalmente preservado repleto de caranguejos que fazem as suas danças hipnotizantes na terra todos os dias.
Essa atmosfera é a gênese da Enseada das Artes. É, sobretudo, a gênese do próprio artista, que colocou ali um pouquinho de suas pequenas vidas, de todas as que viveu até aqui. E não foram poucas.
João Dias é uma âncora da cultura para a Enseada de Brito. Entre outros feitos, encabeçou a criação da Casa da Cultura Açoriana que, com a data de inauguração divulgada, ainda não tinha nem móveis nem arte. Dotado de resiliência e com mãos de fazer, levou móveis e peças suas que organizou com a ajuda de outros da comunidade, para o antigo casarão construído na época do Brasil Império, que é também uma das mais antigas edificações da cidade e que se transformou em um ponto cultural importante para o estado de Santa Catarina. Algumas coisas permanecem por lá, assim como a sala criada em referência a sua arte como reconhecimento da comunidade local.
De alma simples, coração imenso, Dão é um mestre no manuseio da cerâmica e possui obras premiadas e reconhecidas, inclusive rodando o mundo. Nasceu em Florianópolis mas foi registrado na querida Enseada, comunidade que tem dificuldades em deixar. Trabalhou por 16 anos no famoso restaurante Bossa Nova que pertencia à família, onde expôs suas primeiras obras e teve contato com artistas renomados que inspiraram sua inventividade.
Vivendo desde os anos 80 na Enseada de Brito, Dão tornou-se um artista polivalente cuja obra se reflete e é refletida pela cultura local. Entre seus trabalhos mais importantes estão: a criação da Via Sacra composta por 14 quadros expostos na Igreja de Palhoça e a série Franciscos, com uma obra que foi recebida como presente pelo Papa Francisco no Vaticano.
Para Dão, a arte vem carregada de verdade e afetividade que se entrelaçam com a sua história e com as histórias das origens locais. É assim que o seu trabalho ganha uma força regional como uma homenagem a cultura açoriana enseadense mas com uma luminosa pitada de mundo.
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